Gabriel Bunge
Traduzido por Frank Pereira
Entrevista conduzida por Olga Bogdanova com a ajuda de Vasily Tereshchenko
Pe. Gabriel, o que para você é o mais valioso na comunicação com outra pessoa?
Isso depende da profundidade da comunicação. Falando de modo geral, é maravilhoso quando as pessoas conseguem encontrar uma linguagem comum umas com as outras. Se formos falar de outros aspectos da comunicação, então o mais valioso é quando você pode encontrar a imagem de Deus em outra pessoa. Todos nós fomos criados à imagem de Deus; no sentido absoluto, esta imagem é Cristo. Se pudermos encontrar essa imagem em outra pessoa, isso se tornará a coisa mais valiosa que pode haver na comunicação; esta também é a base da verdadeira amizade. Ou seja, não apenas algum tipo de simpatia humana natural, mas o reconhecimento da outra pessoa como sendo a imagem de Deus.
Com que frequência, e com que regularidade, você lê a Sagrada Escritura?
Comecei a ler a Sagrada Escritura muito cedo, muito antes de entrar no mosteiro. Mais tarde, portanto, me pareceu perfeitamente natural que no mosteiro lêssemos as Escrituras diariamente, tanto durante os serviços divinos quanto em nossas celas. Já sou monge há cinquenta anos. Agora, tendo simplesmente memorizado muitos textos, muitas vezes os contemplo. Isso permite que um significado mais profundo se abra, acima do que pode ser obtido durante uma simples leitura. Você pode ler um texto 100 ou 1.000 vezes e, então, pode lê-lo uma vez e, de repente, perceber que nunca realmente o leu uma única vez, porque uma nova profundidade se abriu para você, como nunca antes. O texto da Sagrada Escritura é como um poço insondável.
Está dito que é necessário ler a Sagrada Escritura com uma predisposição intima. Este é um bom conselho?
Naturalmente! Certos Santos Padres dizem que só se pode ler o Evangelho de joelhos. Este livro não deve ser lido como um texto comum. Ou seja, se alguém lê a Bíblia como um livro comum, a revelação não será percebida adequadamente.
O que, especificamente, é essa disposição intima? Como isso pode ser explicado para alguém que está apenas começando a ler a Bíblia?
Essa disposição é o forte desejo de ouvir a palavra de Deus, e não simplesmente uma curiosidade ou desejo de adquirir conhecimentos. Claro, o estudo formal de textos bíblicos - estudo filológico, por exemplo, ou outros tipos - tem sua base. Mas a certa altura é preciso deixar tudo isso de lado e receber a palavra de Deus como ela é. A Bíblia se explica. Como se costuma dizer, a luz não precisa de outra luz para ser o que é.
Em nossa tradição eclesiástica, pessoas que se ocuparam da teologia foram aquelas que tiveram uma experiência pessoal de comunhão com Deus e de oração. Mas, como alguém pode ser um estudante de teologia hoje, seja em uma igreja ou instituição secular? Afinal, o sistema educacional e o calendário acadêmico não envolvem de forma alguma ter um instrutor espiritual, por exemplo, que possa transmitir a experiência pessoal com Deus ou conduzi-la.
Alguém que estuda teologia sem vida espiritual não entenderá nada. No Ocidente, existem professores de teologia que não são crentes; há até padres que não acreditam em Deus, que veem seu ministério como um trabalho, uma forma de ganhar dinheiro. Isso pode parecer improvável, mas tenho evidências de que é realmente o caso. Glória a Deus, eu mesmo nunca encontrei pessoas assim, mas meus amigos têm a experiência de lidar com elas. Bispos que conheço dizem que existem padres que perderam a fé e servem apenas porque precisam ganhar a vida e sustentar suas famílias. Este é o fim.
Para que isso não aconteça, é preciso aprender com os Santos Padres. Eles eram altamente educados em termos seculares: eram retóricos e filósofos que conheciam literatura e línguas. Mas esse conhecimento era apenas um instrumento para eles. Os próprios Padres levaram vidas espirituais extremamente profundas.
A presença de conhecimento de forma alguma implica que você entenderá corretamente as Escrituras; a questão é como fazer uso desse conhecimento. Sabemos que a teologia ariana foi baseada inteiramente na Bíblia. Quando estava tentando Cristo, Satanás citou a Sagrada Escritura - isto é, ele conhecia esses textos, citando-os não para penetrar em seu significado, mas para torcê-los e virá-los do avesso. O melhor meio de abusar das Escrituras Sagradas é citar apenas metade dos versículos, e não versículos completos.

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